Esse relato foi iniciado em 25/10/2011, a primeira vez que respirei depois do parto. Foi quando num sono mais profundo e demorado da Renata percebi que eu era capaz de escrever. E assim ele começou: Daqui 3 dias a Renata faz 2 meses, o furacão passou, veio a calmaria depois da tempestade. Começo a sentir saudades do bebezico que segurei nos braços dia 28/08/2011 as 17:21 e vejo que está na hora de começar o relato do parto. Da barriga não sinto saudades, tenho um sentimento estranho quando me vejo grávida nas fotos. Tenho um carinho de saber que dentro dela a Renata crescia, que ela estava ali só minha, imagino o jeitinho dela nadando dentro de mim e só sinto amor, um amor infinito, mas junto vem essa sensação esquisita. Uma espécie de vergonha, seria uma vergonha alheia se eu não estivesse falando de mim mesma, mas será que era mesmo eu ali na foto? Laura Gutman sabe das coisas. Do parto veio uma explosão e sobraram só fragmentos. O amor os uniu, muito rapidamente, instantaneamente, mas ganhamos uma nova forma: nascemos mãe e filha. Somos nós, numa dependência mútua, perdidas num mundo novo onde ela nunca esteve e eu não reconheço mais. Temos medo, demais, ela chora, grita e eu rezo, não com menos desespero, estamos sozinhas no desconhecido. Eu sempre quis ser mãe, mas graças a Deus não aconteceu antes. Eu não tinha a menor idéia de que era assim. Entendo até ter perdido um filho alguns meses antes de engravidar da Renata, eu não estava preparada, nunca estive. E nem dessa vez eu estava, mas acho que estava pronta para me preparar rapidamente assim que ela nascesse, entende? Não com muita facilidade, nem folga, mas no limite do preparo. Se ela nascesse um dia antes seria diferente. Se ela nascesse na sexta feira ao invés do domingo seria outra história. Pouco antes do natal de 2010 descobri que estava grávida, outra vez. Esse “outra vez” deve ter passado na cabeça de todo mundo. Alguns meses antes tive uma gestação anembrionada. O corpo se preparou, o saco gestacional estava ali pronto pra abrigar um futuro ser, os hormônios estavam a mil, mas acabamos dando pra trás. Não estava na hora, não tinha mãe e não tinha bebê. Não senti repulsa pelos restos da gravidez que não se sustentou, não senti uma vontade de tirar aquilo de mim imediatamente e fingir que nada aconteceu. Esperei uma semana inteira para que aquilo se resolvesse de forma natural e hoje sei que poderia ter esperado mais. Apesar de sedada e com bastante analgesia a curetagem foi muito dolorosa e violenta, mas isso agora não importa mais. Estava outra vez ali, com os dois risquinhos cor de rosa mais significativos da minha vida. Grávida outra vez. Era Renata, renascida. Não sei e não quero descrever meus sentimentos durante a gravidez, tenho novamente aquela sensação estranha. É ingênuo, é infantil, é ignorante. Me ocupei das inúmeras bobagens que se ocupam as grávidas. Me poupava o tempo todo, de tudo. Parei a atividade física porque tinha sono, parei a reeducação alimentar porque sentia enjôo, comia biscoito de polvilho e todinho de manhã porque sentia vontade. Eu podia, eu estava grávida, carente, sem o Gabriel que precisou se mudar para Ribeirão Preto e me deixou sozinha em São Paulo. Logo eu ganharia um filho, um marido e uma vida nova. Ficaria em SP só por mais alguns meses e também mudaria de cidade. Passei a sonhar com a vida que teria e aproveitei os últimos momentos com as pessoas amadas. Grávida sempre recebe um monte de carinho, ainda bem. A gestação correu fácil, saudável, sem nenhum motivo de preocupação. Meu pré-natal começou em SP e na metade foi transferido para Ribeirão Preto, eu vinha nas consultas e voltava pra casa no dia seguinte. Com 6 semanas de gestação lembro de uma discussão na mesa da cozinha onde eu tentava explicar para um homem porque fazia questão de um parto normal. Era o homem mais carinhoso que conheço, sensível, sábio, culto, médico, o homem que eu amo, mas ainda assim homem. Precisei ficar brava em alguns momentos, aumentar a voz, fechar a cara até conseguir ser levada a sério. Não era brincadeira, eu queria parir, queria de verdade. Não sei se convenci mas depois da conversa tive permissão para escolher meu pré natal como quisesse. Fui pesquisar e cada vez ficava mais chocada. Não seria fácil vencer o sistema. Encontrei índices de cesáreas maiores de 90% em algumas maternidades de São Paulo, aquelas que considerávamos boas opções, aquelas bem renomadas, pra classe A e B. Uma vergonha. Percebi que não seria fácil também escolher um médico. Fui entendendo a trágica situação da assistência obstétrica brasileira. Me senti extremamente angustiada e sem saída. Escolhi meu médico pela internet, aliás a internet tem se mostrado uma ótima amiga. Encontrei nela a solução para a falta da rede familiar feminina que vivemos ultimamente. Não temos mais com quem conversar assuntos de mulheres. Viemos de famílias pequenas, com poucos irmãos e saímos muito cedo de casa para trabalhar. Somos filhas das mães da década de 60, as que queimaram sutiãs, as que se libertaram do pecado original, mandaram a Eva pro museu e aderiram ao parto sem dor. Somos as filhas das cesáreas, das mamadeiras, das chupetas, das creches, das babás. Nossas amigas também não entendem nada dessa conversa. São todas profissionais muito bem sucedidas e de sexta-feira sentamos no boteco em frente ao copo de cerveja e a porção de calabresa. Não temos mais assuntos de mulheres. Não falo de discutir afazeres domésticos, falo de trocar experiências íntimas, profundas, coisas que são só nossas. Gestação e parto são coisas genuinamente femininas, e são deliciosas quando tratadas assim. Então cheguei na casa Moara. Estive lá ao todo umas 4 vezes. Fui apresentada a um modo completamente diferente de assistência a gestante. Logo na entrada fotos artísticas de nascimentos são expostas, mães extasiadas e recém nascidos acolhidos com muito amor. No fundo espaço para vivências das gestantes e das novas famílias. Na recepção um cronograma de todas as atividades que acontecem no local. Durante a consulta conversamos por mais de uma hora numa sala charmosa, sem mesa, no sofá mesmo. Conversamos sobre estar grávida, sobre o aborto anterior, sobre o namoro/casamento/parceria, e sim, sobre parto. Sai de lá com um pendrive lotado de artigos e informações sobre TUDO o que precisava saber. O exame físico também foi realizado com calma e pela primeira vez um ginecologista me deu um espelho e um espéculo na mão e disse: coloca você. Sensacional. Pronto, esse era meu médico, e faríamos um parto hospitalar com ele. Fiquei um pouco incomodada ainda por pensar não me enquadrar. Me perguntei se aquilo tudo não era demais, além do que, ia ficar muito caro. Eu não era a patricinha de escova e unhas feitas da cesárea marcada mas tão pouco a hippie chique do parto orgásmico domiciliar e na banheira. Eu só queria um simples parto normal! E estava difícil conseguir. Na segunda consulta do pré-natal já fui sozinha. O Gabriel passou na residência de Psiquiatria em Ribeirão Preto e fiquei em São Paulo até a licença maternidade. Disse ao Dr. Jorge que talvez mudasse de cidade antes do parto e ele me passou 2 contatos: o primeiro de uma paciente que viajou 400km em trabalho de parto de um bebê pélvico para parir de forma natural em São Paulo, o segundo da Eleonora, coordenadora do Despertar do Parto. Entrei em contato de forma tímida. A única coisa que eu queria era o nome de um obstetra que fizesse um parto normal em Ribeirão Preto. Não queria nome de parteira em São Carlos, nem saber de parto domiciliar, nem de doula, muito menos de grandes viagens em trabalho de parto. Aquilo tudo parecia loucura. Consegui o nome que queria e esse foi o médico que me acompanhou em Ribeirão. Nisso a vida passou, continuei morando em São Paulo e trabalhando até as 32 semanas de gestação, nos fins de semana vinha ver o Gabriel e procurar lugar pra morar. Em junho fizemos um Chá de bebê/Despedida e no começo de julho mudei definitivamente. Tinha um apartamento novo para arrumar, um quarto de bebê para montar, um enxoval para terminar de organizar e um marido. Nesse momento começo a adquirir não só o enxoval prático, com roupas e berços e banheiras e tudo o mais que a Renata precisava mas também o enxoval emocional. Este último não ganhei de mão beijada, ainda está sendo montado, e ainda não sei quais são todos os itens necessários. Foi ai que comecei a participar ativamente da lista de discussão Parto Nosso. Difícil dizer o quanto isso foi forte pra mim, ainda quero rever os momentos mais importantes, as mensagens trocadas, os preconceitos caindo, os medos sendo revelados. Era onde eu passava minhas tardes e algumas madrugadas quando o calor insuportável, a falta de ar ou a azia não me deixavam dormir. Mas a verdade é que eu não fazia parte desse mundo de parto humanizado, eu não sabia o que era, tinha simpatia mas tinha acabado de chegar. E por não conhecer não tive medo e me expus. Não fui muito bem recebida. Pela primeira vez, grávida, ouvia desaforos. E o pior é que nem entendia porque. Que diabos tem de errado? Foi fácil e rápido entender o absurdo que é o índice de cesáreas desnecessárias realizadas no Brasil, eu sempre fui contra isso. Mas qual o problema do parto normal hospitalar, aquele clássico, aquele que presenciei diversas vezes na faculdade, aquele que minha mãe me conta desde que eu era pequena, aquele que acontece sempre? Que negócio é esse de parto frank? Porque eu precisava de uma equipe humanizada, de uma doula, um plano de parto? Isso eu só entendi porque elas me ensinaram. Ai foram relatos e mais relatos, trocas de experiências, medos revelados e uma certeza: para parir precisa se abrir. Precisa entrega. E se eu não conseguir me entregar tanto assim? E se eu travar na hora? Tive MEDO!! Será que esse tal de parto frank, mesmo eu não achando tão frank assim, iria me atrapalhar? Em alguns momentos eu maldisse a hora que entrei nesta bendita lista. Melhor era não saber de nada disso. Medo do parto. Esse foi o sentimento que rondou nas últimas semanas. Tive um mês inteiro pra ter medo do parto. Pensando nele todos os dias. Pensando exaustivamente, imaginando, tentando adivinhar o sabor, o cheiro, o som. Medo da dor, mas medo principalmente de não parir. Eu sei que de um jeito ou de outro minha filha sairia de mim. Mas saberia eu ser mãe, cuidar de uma criança, sem ter passado pelo ritual do parto? Como meu corpo saberia que ela era MINHA FILHA? Como arrancar um bebê de dentro de sua mãe sem que ele fizesse a passagem? Que consequências emocionais, espirituais, isso traria pra nós duas? Como teria forças pra cuidar de um bebê se cortassem minha barriga? E se a dor fosse muita? E se eu não conseguisse mais levantar da cama? E se roubassem ela de mim? E se eu não fosse mulher suficiente pra ser mãe? E se eu não tivesse coragem? E se ela não tivesse orgulho de mim? E se eu não fosse mulher pra parir? Lia demais tentando entender o que acontece no parto. Comecei a pensar nele como um rito de passagem, uma espécie de transe. Passei a achar que a dor não era só dor mas um estado alterado da consciência. Tive medo de enlouquecer. Tinha medo de surtar. O que era a Partolândia que todas diziam? Eu ficava apavorada mas ao mesmo tempo sabia que precisava passar por lá antes de ser mãe. Pelo menos pra ser a mãe que eu desejava ser. Era necessário para o nascimento não só de um bebê, mas de uma mulher mais forte, poderosa, segura, que desse conta da demanda. Dormia todas as noites pensando se acordaria com contrações. Acordava decepcionada, ainda não era agora. As vezes acordava com uma contraçãozinha de nada, mais uma, mais uma, torcia e rezava em silêncio pra que ela ficasse mais forte. De repente nada mais acontece. Todas as vezes, todas as infinitas vezes, que ia ao banheiro fazer xixi torcia para que tivesse perdido o tampão. Ah, esse tampão que até hoje não vi a cor. A Renata mexia e mexia. Depois ficava um tempo sem mexer. Ai eu meio que me preocupava e ela mexia outra vez. Chutava, me empurrava, me assustava, me fazia dar gritos de susto algumas vezes. Era brava e agitada desde dentro da barriga. As vezes eu deitava e me entregava na cama, pedindo: vem contração, vem! As vezes elas vinham, e eu me entregava mais: vem vem vem mais forte dessa vez! E então elas paravam. Eu ficava triste. Triste de verdade. Será que alguma coisa estava errada? O que desencadearia isso? O que estava faltando? E era mais um dia. E eu enorme. E mais relatos. E mais discussões. E nomes me foram apresentados. Laura Gutman, Naoli Vinaver, Ina May Gaskin, conheci Eleonora de Moraes e Helena Junqueira pessoalmente, entendi a importância da Ana Cris, descobri quem era Jamile, Melania, ouvi falar de Carla Polido, troquei mensagens com Ana Paula Caldas, me emocionei com Jobis Estevão. E mais relatos, e mais partos e mais vídeos. Ufa, entendi. Mas agora já eram 41 semanas. Não dava tempo nem dinheiro de equipe humanizada. O que podia já tinha sido feito. Era eu, minha coragem e fé em mim e no Dr. Rafael , que de vez em quando falhava um pouquinho. Última prova: USG das 41 semanas, fiz não querendo fazer, chorando, morrendo de medo. Mostrou um peso estimado de 4,260Kg com comprimento de 48cm e circunferência abdominal que não lembro mas bem grandinha. Macrossomia assimétrica. Chance de distocia de ombro. Aaaaarrrrggggg que ódio. E agora? Dr. Rafael não fecha a sentença da cesárea mas faz questão de jogar a responsabilidade pra mim. Minhas fontes humanizadas diziam que não existia NENHUMA EVIDÊNCIA científica desse risco, eu não era diabética e mesmo se fosse o risco só aumentava com peso maior de 4,5Kg. Mas a dúvida foi colocada. E eu dou conta dum bebe desse tamanho? E eu dou conta de acreditar que USGs erram? E eu dou conta de acreditar nas evidencias científicas? E eu dou conta de parir? Marquei um novo USG pra dia 26/08, no Hospital onde Dr. Rafael estava de plantão, ele acompanharia o exame “e se for o caso já resolvemos na sexta mesmo” aaahhhhh que ódiooo. Eu, a que queria querer um parto ia também cair no conto do vigário. Chorei. Agora, depois de tudo que eu sei, fazer uma cesárea por um motivo que nem é motivo, sem nem entrar em trabalho de parto? Ah quis morrer. Tentei digerir isso tudo, fiz uma carta justificando minha fraqueza e a cesárea caso ela acontecesse e joguei na Parto Nosso, elas ficaram putas comigo e foram mais desaforos. Briguei com o Gabriel, dormi a pior noite de todas de quinta pra sexta. Acordei com um email do Dr Jorge me dando forças. Minha mãe já estava com a gente fazia uns dias, na iminência da cesárea ligamos pro meu pai, minha sogra, e na sexta de manhã estavam todos em casa. Meus pais, minha irmã, meus sogros, todos com os olhares famintos de hoje teremos bebê. Só eu não queria, eu e a Renata. Fui segura pro Hospital. Não faria a cesárea. Minha mala estava pronta mas fiz questão de deixá-la em casa. Se meu segundo USG tivesse um milímetro, um grama mais favorável eu não faria cesárea de jeito nenhum. Se não tivesse, eu pensaria na hora. Eu tinha argumentos e eu estava certa, as evidências estavam a meu favor, eu tinha informação e eu tinha apoio. Agora era comigo e fui cheia de coragem. Repetimos o USG e tínhamos um bebê mais razoável, não muito diferente mas o suficiente pro meu medo aliviar. Pulei da maca feliz da vida dizendo que voltaria pra casa. Ele sorriu e disse, é, vamos esperar o trabalho de parto. Voltei pra casa numa felicidade que transbordava. Tudo agora ia dar certo. Me agarrei em coisas boas e num email da Jobis: Em vez de te dizer que seu corpo não vai falhar, pergunto: por que ele falharia? Curti a casa cheia. Estava morrendo de saudades do meu pai que desde que mudei pra Ribeirão não vinha me visitar. Depois disso meus sogros foram embora e meus pais ficaram. Veio então o sábado. A véspera do parto foi importante. Eu tinha me libertado da cesárea eletiva, mas agora eu precisava de um trabalho de parto. Eu sentia contrações fazia tempo, não eram mais novidade. Tentei provocar meu corpo utilizando a estratégia dos “hots”. Tomei uns 3 banhos demorados intercalados com comida apimentada (até uns golinhos de caipirinha eu tomei). Namoramos lá no quarto no meio da tarde. Era difícil se entregar com aquele barrigão gigante mas era isso que eu estava precisando. Entrega. Essa era a palavra dali por diante. O Gabriel ficou no quarto e eu fui pra sala com meus pais e minha irmã. Foi um momento que nunca vou esquecer. Não sei quem começou e porque mas colocamos músicas do Chitãozinho e Xororó no Youtube e ficamos cantando alto, dando risada. Lembramos de quando éramos crianças e íamos numa pizzaria que tocava música ao vivo, isso fazia muito tempo. Íamos bastante nesse lugar. Meu pai pedia músicas pelo guardanapo, sempre as mesmas, e sempre as que iriam tocar de qualquer jeito. As vezes ele pedia Fagner. Era divertido. A Renata começou a mexer tanto, mas tanto. Todos ríamos do tanto que minha barriga mexia. Dava pra ver de longe. Foi das vezes que mais mexeu. Depois demos uma pausa pra um passeio, tomamos sorvete e no mercado comprei um saco de doritos hot e canela pra fazer com chocolate. O Doritos deu tempo de começar a comer. O Chocolate com canela nunca foi feito. Senti minha calcinha úmida demais, mas pensei que não fosse nada. Começou a incomodar e fui trocar de roupa. Troquei e ninguém notou. Voltei pra sala. Quando levantei do sofá percebi que estava molhado. Eu tava perdendo mais líquido. Continuava sentindo as mesmas contrações, sem nenhuma novidade. Chamei o Gabriel e contei que estava ficando molhada. Troquei de roupa outra vez. Ai ela molhou mais e mais rápido. Levei o Gabriel pro banheiro comigo. Tirei a roupa e começou a pingar. Era bolsa rota, não tinha mais dúvida. Coloquei um absorvente e voltei pra sala. Meu pai e minha irmã estavam se preparando pra voltar pra São Paulo. Eu pedi pra eles ficarem. Disse que achava que não iria demorar. Eles ficaram confusos, queriam saber o que estava acontecendo. Disse que a bolsa tinha estourado, mas que não dava pra saber quanto tempo iria demorar. Fiquei na dúvida sobre ligar pro obstetra. Eu não queria ir pro Hospital. Não estava em trabalho de parto ainda. Sabia que ele me mandaria ir. Liguei! Eu tinha streptococcus agalactiae positivo nos exames e já havíamos combinado tentar pelo menos 3 doses de antibiótico antes do parto. Ele me mandou pro Hospital. Isso era umas 10 da noite. Pedi pra esperar um pouco em casa e ele disse que não. Meu pai e minha irmã desistiram de voltar pra São Paulo, tentaram comprar as passagens pela internet mas o site travou bem na hora. Era um sinal. Enrolei até meia noite pra ver se a coisa engrenava. As contrações estavam aumentando de intensidade e frequência, mas eu queria mais. Tomei um banho demorado, terminei de arrumar a mala. Eu tinha feito uma lista de músicas no computador com nome de parto, o Gabriel perguntou se eu queria levar. Eu disse que não, ele levou mesmo assim. Eu estava calma, muito mais do que pensei que estaria, e muito feliz. Alguma coisa agora ia acontecer. Meu medo de nunca entrar em trabalho de parto se foi. Eu estava feliz. Fomos todos, o que foi uma bobagem, não tinha lugar lá pros meus pais ficarem, mas sei também que não dava pra ser diferente, gostei da presença deles no caminho até o Hospital. Não lembro se tinha carro na rua. Também não lembro qual era a lua, mas eu estava conectada com o céu da noite. Coloquei o braço para fora da janela enquanto o vento batia na minha mão. Eu tinha a sensação de plenitude, ah, era só prazer. Sensação de vazio preenchido. Então achei bom que o Gabriel levou o cd e coloquei Elis cantando Zazueira. Ela vem chegando, ela vem chegando. A música me emocionou, mas não quis me entregar, segurei o choro. Eu estava guardando a entrega para outro momento. Não queria deixar transbordar, ainda não. Eu continuava calma e consciente, tinha vontade de mais. As contrações estavam constantes agora, mas eu queria mais, mais forte! Chegamos no Hospital, meus pais ficaram em um saguão longe do centro obstétrico, entrei com o Gabriel. A enfermeira pediu pra aguardar que estava internando outra paciente. Ficamos, sei lá, uns 40 minutos esperando. Tinha uma TV ligada, estávamos só nós 2 na sala de espera. Era 1 e pouco da manhã e na TV passava Instinto Selvagem 2. Fiquei andando de um lado pro outro e contamos as contrações: 1 a cada 5 minutos, mas continuavam fracas. Eu ainda gostava das contrações. O que eu queria mesmo era entrar em trabalho de parto de forma espontânea mas tinha quase certeza de que não iriam deixar. Entramos e uma residente me atendeu. Duvidou do meu diagnóstico de bolsa rota mas fez um toque e confirmou, a água inundou a maca. Viu também que o colo estava dilatado 1 polpa e estava grosso e posterior. A Renata ainda estava alta. Perguntou o que eu tinha combinado com Dr. Rafael e eu disse que era parto normal. Saiu pra telefonar. Voltou dizendo que ele chegaria pela manhã e que ela colocaria misoprostol para preparar o colo até ele chegar. Não gostei, questionei, a residente me explicou um pouco insegura que este era o protocolo. Bolsa rota não poderia demorar muito para resolver e como o colo não estava favorável precisava induzir. Deixei. Fizeram minha internação, me deram uma dessas camisolas abertas atrás e mais uma para eu colocar ao contrário caso fosse caminhar. Fui para o pré parto e estava vazio. O Gabriel ficou comigo o tempo todo. Deixaram ele entrar no banheiro comigo enquanto eu tomava banho. Nem mencionaram a raspagem dos pêlos pubianos ou lavagem intestinal, não eram procedimentos realizados de rotina. Perguntei se poderia vestir minha calcinha e um absorvente para caminhar, não queria molhar todo o hospital com aquele pinga pinga, concordaram. Colocaram o misoprostol e pediram pra eu ficar deitada por 30min, enquanto isso pegaram minha veia para a Penicilina, e lá foi a primeira dose. Tiraram o soro para não prejudicar minha movimentação. Passaram os 30 minutos levantei da cama e sai. Fui procurar meus pais no outro saguão. As contrações estavam aumentando. Fiquei lá fora até que meus sogros chegaram de Mococa e buscaram meus pais no hospital, depois vieram pra minha casa. Nisso eu entrei com o Gabriel e tentei dormir um pouco. Era impossível dormir. Elas estavam bem próximas agora, intervalo de uns 3 minutos entre elas, estavam mais fortes também, mas eu estava confortável. O Gabriel cochilou do meu lado, sentado numa cadeira, ligaram a TV e estava passando jogo de vôlei feminino, acho que era contra Cuba, não me lembro. Não lembro também se o Brasil ganhou. Hora do misoprostol e do antibiótico, 30 minutos esperando fazer efeito, sem poder levantar. Dr. Rafael chegou. Lembro que ele ouviu o BCF, não lembro se fez toque, lembro que sugeriu que eu caminhasse e lembro que era o que eu mais queria. Por coincidência estava de plantão naquele dia e me disse sorrindo que não tinha pressa, tínhamos 24 horas a partir dali. Fiquei um pouco aliviada. Tomei café. Em nenhum momento me impediram de comer, comi quando cheguei, tomei café de manhã, tentei almoçar mas não consegui, perdi a janta, tomei café depois do parto. Tinha água a vontade também. Vesti minha segunda camisola e sai pra caminhar. Eu adorava ficar longe do quarto. Fui pro jardim fora do hospital onde os pacientes tomam sol. Fiquei sozinha com o Gabriel naquele lugar, estava bastante calor, o céu continuava limpo, azulzinho claro dessa vez, muita luz do dia. Eu caminhava e respirava fundo durante as contrações, as vezes nem doía, as vezes era gostoso, as vezes dava um pouco de medo. Onde será que isso iria parar? Elas estavam bem fortes agora, intensas, até quando não doíam eram intensas. Sem dúvida alguma coisa muito importante acontecia ali. Eu tava cansada mas me sentia forte, agüentava muito mais que aquilo. Pode vir, meu bem, que sua mãe está aqui. O Gabriel deitou no banco e dormiu, eu caminhava, dava voltas, nem sei quantas voltas dei naquele jardim, respirando e andando. Feliz, eu sentia felicidade, ela vinha chegando. Hora do antibiótico. Mais misoprostol. Mais deitada por 30 minutos. O Gabriel me deixou um pouco pra ir dormir no conforto da Psiquiatria. Foi ai que fiquei só. Durante a madrugada outra mulher internou. Quando eu voltei pro pré parto ela estava indo pra cesárea. Tive medo. Uma enfermeira sugeriu que eu ficasse no chuveiro pra aliviar a dor, depois dos 30 minutos aceitei. Mas o Gabriel não tava lá, fui sozinha. Entrei no chuveiro, que ficava em outro quarto, longe de todo mundo. Fiquei lá sozinha. As contrações já estavam quase contínuas e fortes, bem fortes. A água quente caindo nas costas e na barriga era gostoso. Mas eu estava lá sozinha. Comecei a entender que sozinha dá medo. Comecei a pensar que se fosse meu banheiro, que se tivesse mais espaço, que se tivesse uma banheira, que se tivesse alguém comigo, que se alguém dissesse que era assim mesmo e que eu estava indo bem seria mais fácil. Mas ali daquele jeito eu só sentia medo. Sai do chuveiro, vesti a camisola e voltei pro quarto. Consegui achar minha escova de dentes na mala e isso trouxe de volta a sanidade. Voltei a ficar forte, renovei as energias e estava pronta pra mais agora. Andava dentro do pré parto, tinha algum show passando na tv, acho que na globo, talvez fosse criança esperança, sei lá, acho que não era. Prestei atenção quando o Chitãozinho e Xororó cantaram, lembrei da noite anterior. Andava dentro do quarto. Cadê o Gabriel? Chegou o almoço. Eu tava com fome. Sentei pra almoçar. Era um pedaço de frango impossível de comer com talher de plástico. Eu colocava a comida na boca e lá vinha contração. Nessa altura ela tava forte, muito forte. Eu levantava da cadeira e caminhava, andava dentro do quarto até ela passar. Mas eu tava com fome. Só lembro que tinha medo da enfermeira levar embora meu prato, eu queria comer, só precisava levantar e andar pra suportar a contração. Ela passava eu sentava de novo, as vezes nem dava tempo de colocar a comida na boca e lá vinha outra. Forte, muito forte. Eu andava e me conectava com a barriga. Me concentrava, sentia a contração com todos os meus sentidos, era como se não houvesse mais barulho, mais ninguém no quarto, mais nada. Com licença, para tudo que estou tendo uma contração. Sofri muita interferência por estar num Hospital Escola. Nesse momento várias pessoas circulavam por lá, residentes, internos, enfermeiras, estudantes de enfermagem. Não me lembro de nenhum. Só da interna. A interna ficou 10 minutos com a mão na minha barriga e teve a infelicidade de dizer que eu não tive contração nenhuma. Ta certo que eu fechei os olhos e tentei ignorar a presença dela, eu tava em outra. Mas nenhuma contração?!?!? Ta louca!?!? Ai não agüentei e demonstrei minha indignação, ela me pediu pra ficar mais 10 minutos ali e que eu mostrasse pra ela as contrações. Eu deixei. Pensei que seria melhor se eles não estivessem lá. Mas fui bem tratada por todos, não tenho tanto o que me queixar. Tentava esquecer que estavam ali, concentrava no meu corpo e quando vinha a contração tentava relaxar. O Gabriel voltou, ficou do meu lado. Eu já tava cansada e não queria mais saber de caminhar. A Renata ainda não estava na posição certa e Dr. Rafael me dizia de que lado deveria deitar pra ajudar ela virar. Fiquei ali quietinha. A contração vinha e eu fechava os olhos, tentava me entregar, eu nem sabia mais o que era não ter contração. Lá por umas 2 da tarde eu abro os olhos e Dr. Rafael está ali me olhando, pergunta se eu estava dormindo e eu digo que não. Dormir como? Ele diz que não entende o meu não gostar de analgesia. Eu digo que não quero. Ele diz que eu agüentei firme até ali, que foi bastante, que a anestesia podia ajudar a relaxar o períneo, que eu poderia dilatar mais rápido. Eu digo que não quero. Ele sai de perto, depois de dizer pra eu pensar bem. Aaahhh eu sabia que isso ia acontecer. Ele saiu e a contração continuou com a mesma intensidade, mas agora mais difícil de agüentar. Chamei de volta e disse: Dr. ta doendo, muito, mas se você me disser que precisa agüentar eu agüento muito mais. Eu to bem. Não quero que nada dê errado. Ele disse que não era necessário. A partir dai percebi que não teria ajuda pra ser do jeito que eu sonhei. Era o fim do trabalho de parto tranqüilo e o bicho estava pegando. Sozinha eu tinha medo. Não sabia se conseguiria e sem apoio comecei a acreditar que não ia dar certo. As contrações ficaram então insuportáveis. Cedi. Chamaram o anestesista e fui caminhando pra sala de parto. Ele se apresentou, me explicou o procedimento e nessa hora eu só queria que a dor fosse embora. Tive raiva, principalmente de mim. Pensei que tudo estava acabado, eu entreguei meu parto nas mãos dos médicos. Entre uma contração e outra senti a picada nas costas e foi feito o duplo bloqueio com a anestesia combinada raquidiana + peridural. A raquidiana age na hora e a peridural mantém um cateter para administração de outras doses se necessárias. O anestesista me explicava e era gentil, eu só com raiva por ter cedido. Depois disso parte do meu trabalho de parto foi roubado. Eu sai da partolândia, onde tudo era intenso, tudo acontecia, onde meu corpo trabalhava e fui para um estado onde não sentia mais nada. Não tinha mais dor, não tinha mais contração, minhas pernas estavam dormentes. Tudo acabou. Eu estava sedada e sentia um conforto que minha intuição dizia não ajudar em nada. O que animou foi que o toque logo após a anestesia mostrou que a dilatação estava avançando, eu tinha 5 p/ 6 cm agora. Era só esperar. Voltei pro pré parto e fiquei deitada. Nesse momento começaram a chegar as visitas. Opa, visitas? Eu não queria ver ninguém mas como eu sabia que estava todo mundo louco pra saber notícias deixei entrar. Meu plano era acalmar o pessoal rapidinho e depois me entregar ao que realmente interessava. A primeira a entrar foi a minha sogra, conversou com a moça que também estava no pré parto (eu tava tão em outra que mal tinha notado ela ali) e fez questão de esperar até a residente passar com o sonar pra ouvir o bcf. Hmm, bcf ok, tchau sogra, tudo certo por aqui, pode ir tranqüila. Ela saiu e o Dr. Rafael veio me examinar outra vez: 9cm. Uau! Mas como assim tão rápido? Foi ai que voltei a acreditar que daria certo. Em algum momento entre os 6 e os 9 cm ligaram ocitocina no meu acesso venoso devido as contrações que diminuíram bastante. Mas eu nem tinha notado que elas voltaram. Nisso entrou meu pai, disse sorrindo pra ele que já estava terminando, pra voltar e acalmar todo mundo, estava tudo bem. Ele foi bem rapidinho, me deu um beijo com os olhos molhados de felicidade. Pedi que mandasse o Gabriel de volta e não deixasse mais ninguém entrar. Eu queria me concentrar! O Gabriel voltou e pegou minha mão. Nisso passa uma auxiliar de enfermagem toda sorridente dizendo que minha mãe estava ali e queria entrar. Fechei a cara e disse forte que NÃO! Po, tava difícil de entender que EU tava parindo? Que o parto era meu e que o trabalho intenso estava pra começar???? Mais uma vez fiquei com raiva. Não da minha mãe, coitada. Mas da falta de sensibilidade do resto do mundo. Tem uma coisa importante acontecendo aqui. Será que dá pra vocês se comportarem? Tive dó da minha mãe, medo do que a auxiliar assustada fosse dizer pra ela e mais uma vez permiti outra interferência. Minha mãe entrou (acho que a auxiliar deixou ela entrar mesmo com a minha negação), pegou na minha mão e disse: ai filha, como ta? E ai? Me conta! Pensando agora é até engraçado mas na hora só lembro que pedi pra Deus que ela entendesse e respondi: mãe, ta nascendo. Ta tudo bem, mas me deixa aqui com o Gabriel (toda vez que alguém entrava a enfermagem deixava o Gabriel lá fora!). Ela saiu e a dor estava forte outra vez. Chamei o Dr. Rafael e disse que queria outra anestesia. Ele disse que estava nascendo. Será? Mas assim tão rápido? (Eu tava sem a menor noção de tempo e as 16 horas passaram voando). Como quase todo o efeito da anestesia havia passado consegui levantar da cama. Eu sentia as contrações quase constantes e uma pressão muito forte embaixo. Tinha vontade de fazer xixi, coco, tudo ao mesmo tempo e a impressão era que eu faria de forma involuntária. Pedi pra ir ao banheiro antes de ir pra sala de parto. Não consegui urinar (maldita anestesia) e percebi que estava fazendo coco. Tive vergonha. Não queria sair do banheiro, tinha medo de fazer mais, mas também não podia ficar ali sozinha. Comecei a entender que precisava de entrega, eu não tinha escolha, não era hora de ter vergonha. Decidi que não importava quem estivesse ali, iria me ver parir e eu não dava a mínima. O momento era meu e eu precisava por minha filha no mundo. Sai do banheiro e fui andando pra sala de parto. Lá ganhei outra pequena dose da peridural (por minha insistência, o medo me deixou confusa, quando penso nessa hora não sei porque fiz isso). Eu sentia muita pressão, muita pressão, como se meu útero, meu intestino fossem sair pelo avesso. A sala de parto lotou. Tinham residentes, tinham internos, equipe de enfermagem, anestesista, Dr. Rafael, o chefe da obstetrícia também estava lá e o Gabriel, meu porto seguro. Não sei o que seria sem ele. Quando cheguei na sala olhei na parede e vi um cartaz de manobras de correção para distocia de ombro. Olhei pro Gabriel, pensei no medo que senti, mas ele não existia mais. Iria dar certo. Já estava dando. Posição de litotomia, todos viam tudo menos eu. Eu queria era dar uma olhadinha. Achei que estivesse desfigurada lá embaixo. Só pensava se estava fazendo coco, imaginava meu intestino do avesso, não sei como não chamaram um cirurgião gastro pra corrigir isso na hora. Olhava pras residentes e pensava: porque estão me olhando assim? Como se nunca tivessem visto antes? O Dr. Rafael estava tranqüilo. Foi ai então que disseram: quando vier a contração faça força. Contração? Sim, eu ainda tinha contração mas nessa hora tudo era tão intenso e tão constante que precisei me concentrar para sentir o início da onda. Tentei empurrar por umas 3 vezes, mas eu sentia que estava travando alguma coisa ainda. Tive medo de me partir, eu queria querer parir, mas ainda estava presa, faltava entrega. Nessa hora dei uma olhadinha em volta e fiz a pergunta retórica, precisa mais? Dr. Rafael disse que sim, que precisava bem mais. Tive medo e duvidei que tivesse bem mais ainda pra dar. Tentei mais uma vez. Olhei pra ele que disse: você não vai conseguir? Nessa hora me entreguei, claro que eu queria de verdade, não tinha outra alternativa, depois de tudo isso, depois de tudo pronto. Nossos corpos estavam prontos. Eu já era quase mãe. Minha filha estava ali, quase não só minha, quase separada de mim, quase pros meus braços. Claro que eu saberia como fazer. Claro que eu tinha muita entrega ainda pra dar, muito ainda o que doar. Eu queria me abrir. Deixa explodir o vulcão, vem meu bem, vem pra esse mundo, me mostra outra vez a vida. Pode vir, vem nascer, deixa nascer uma mãe. Vem instante sagrado, me mostra o que realmente importa, me mostra o sentido da vida, me deixa ver o segredo, me dê a resposta do enigma, me deixa encontrar o divino. Vem onda e faço força. Isso, muito bem. Mais uma. Isso, falta pouco. Mais uma vez e pluft. Escorrega de mim. Deixa escapar o excesso, deixa ficar a essência, alívio. Instante de silêncio, tensão. Choro, alma preenchida. Sensação de buraco. Me de minha filha. Tenho ela nos braços e ela tem o meu cheiro, pedaço de mim. Preenchida, cheia novamente, feliz, feliz, muito feliz. Tentei coloca-la no peito mas ela não pegou, tive a sensação de não ter feito certo. Ela era tão pequena e eu estava deitada. Eu queria sentar mas não deixaram. Ainda faltava a placenta, suturar a episiotomia (sim, teve episio). Queria que acabassem logo pra eu ficar com a minha cria, aquele bichinho pequeno que tinha o mesmo cheiro que eu. Deixei que ela fosse com o pediatra e mandei o pai junto. Alguém fez uma piadinha, já está te largando por outra mulher. Não achei graça, queria eu estar com ela, não era outra mulher, era meu pedaço mais frágil e mais poderoso. Comecei a sentir sede, fraqueza, visão turva. Alguém disse que o sangramento era muito. Ligaram mais ocitocina e apertavam meu útero com a mão. Eu não me preocupei, ficaria bem, nunca me senti tão forte. O Gabriel voltou com a Renata nos braços. Esteve o tempo todo do lado dela. Tentou evitar o colírio de Nitrato de Prata mas não conseguiu, era protocolo. Nem perguntei sobre os outros procedimentos. Ela tava enroladinha quando voltou nos braços do pai. Acabaram e me levaram de maca pro corredor, fiquei esperando meus pais entrarem pra espiar enquanto não ia pro quarto. Ela ficou comigo o tempo todo. Nem me importei com a demora. Ali ficamos, num abraço eterno, e ali ela mamou pela primeira vez. PS: Terminei o esboço desse relato em 12 de fevereiro, depois de mais de 24 horas de plantão do Gabriel e overdose de dupla mãe-bebê inspirando o gás final; PS2: Ainda pretendo fazer relato de amamentação e primeiros dias de puerpério, tão intensos ou mais; PS3: No início do relato digo que não sinto saudades da barriga, hoje já sinto diferente, tenho muito carinho e me acho linda redonda, tenho muitas saudades da minha gravidez; PS4: Hoje não dependo só da internet para acessar essa rede de mulheres, ela está se tornando real e sólida, nos encontramos, nos apoiamos e amamos discutir assuntos de mulheres. Estou encontrando amigas reais que compartilham sonhos e que são cada vez mais essenciais na minha vida; PS5: Gostei do meu parto, mas ficou um gostinho de quero mais e melhor; PS6: Virei ativista do parto humanizado e maternidade ativa.
Tamara
14/2/2016 11:58:59
Gostei muito do seu relato de parto. Estou 34 semanas e tbem tenho sentido medo de não conseguir... Mas espero ser corajosa como vc foi. Um beijo
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16/7/2012
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